Este pequeno ensaio pode ser visto como uma viagem para entendermos a aventura humana no Universo conhecido, não é de modo nenhum um estudo exaustivo, mas tenta, sobretudo, ser inovador e questionador sobre a caminhada humana através dos tempos.
A existência é um estado captado pela consciência, é um fato: concreto, abstrato, cultural ou natural. É anterior a ética, a moral, a atribuição de valor, principalmente, anterior a própria consciência. Do ponto de vista da existência não importa a vida ou a morte, o positivo ou o negativo, o bem ou o mal. Estes conceitos neste sentido não são opostos, sequer contraditórios, o que se contrapõe à existência é sua ausência, se algo não existe, inexiste. Assim se falarmos sobre algum tema, ele já existe! Chegamos então a existência humana -concreta e natural-. Nesta, a dimensão superior é o tempo linear, ou seja, de que maneira o tempo age sobre a nossa existência ou da consciência de sua existência - aqui tanto faz, ninguém pode falar da existência se não tivermos a consciência de existir -. O tempo, neste caso, produz mudanças físico-mentais no homem e nas estruturas sociais, quer a nível individual, quer a nível coletivo. O grau percepção que cada ser tem de si e do mundo em sua volta(as outras existências), distingue o seu patamar de abstração, evolução, ou seja, o qualifica a transcender a si mesmo.
Através da história humana, o homem sempre buscou justificação para sua existência (aqui o princípio e o fim da vida biológica), para o fato das coisas existirem, tentando dar sentido a algo que é anterior a ele, a por ordem no caos. Está é a primeira necessidade mental do homem. Quase tão forte quanto aquelas ligadas a sua biologia, no entanto, é necessário para sua exteriorização um mínimo de consciência. A civilização, à cultura humana surgem aí. Pensar a existência do ponto de vista da valorização, é uma criação da cultura humana. Atribuir sentido a sua existência é a última etapa da transcendência(da superação), para tal é necessário uma ética, uma maneira de se conduzir não caótica, não natural.
Da necessidade humana de buscar sua origem e a do mundo que o cerca, surgi à revelação, o mundo mágico da mistificação e por último a religião. A mistificação é a primeira utopia humana, a primeira idealização da vida, neste ponto a religião se apropria do sentimento místico, a fé e os cristaliza em uma instituição. Após, a evolução cultural leva o homem à ciência, a observação, a utopia humana mais acabada, assim, a principal diferença entre as duas utopias é o grau de percepção, que cada uma tem da existência. A mistificação serve ao ser que precisa de um envolvimento afetivo com o ato de viver, à ciência aquele que busca um envolvimento racional com o ato de viver.
Na explicação da existência, a ciência é superior, mas não satisfaz a ânsia dos instintos humanos, contudo na medida que um ser evolui no grau de consciência sobre si e o mundo que cerca, tende a não oposição entre as duas utopias. A relação da ciência com a mística foram se modificando, no princípio existe um atrito forte entre ambas, como a conquista científica foi tomando vulto a cada instante, os místicos, as religiões, passaram a tentar cooptar o método científico para suas teorias. Não atentaram, porém, que a diferença entre as duas não está somente no método de estudo(Lógico-dialético), mas sim na maneira como se encara a existência, seu surgimento, sua função.
O papel da ideologia é fundamental para a distinção entre a mística, o senso comum, do discurso científico. O discurso científico é marcado pela explicitação ideológica, ou seja, na medida que a ideologia aparece no discurso como algo a ser estudado, mas o aproxima de seu caráter. Assim, a ciência assume sua ignorância, questionando sempre o conhecimento para ganhar autenticidade, realidade, enquanto nos outros discursos, a autenticidade se faz sobre a negação da dúvida, afirmando uma certeza dogmática.
O método científico aparece com a observação de fenômenos naturais, uma vez descobrindo-se seu mecanismo, suas leis, passava-se a recriação da experiência, o empirismo-lógico. Para crescer em complexidade para entender as relações humanas, com o método concreto dialético. Neste, a dualidade, a contradição, a oposição aparece como partes de uma mesma realidade, como ocorre no ato de existir. Assim, a existência humana não é somente natural, o homem desde seu surgimento agiu sobre a mesma para modificá-la. As formas humanas de criação, em geral, não apresentam similaridade com as da natureza, da mesma maneira o comportamento humano é diverso dos outros animais. Não é o caso de comparações valorativas, mas sim de reais diferenças, o homem não é superior ou inferior é diferente, mais complexo.
A dialética é o método científico mais acabado para entendermos como se dá o ato de existir. Este fato é contraditório em sua origem, para algo existir é preciso por oposição a não existência(!?). Assim, tudo existe! E tudo sempre existiu! Apesar da vida biológica ter surgido em nosso mundo há pouco tempo. Na dialética, os contraditórios se complementam como também se explicam. A condição para a existência biológica é a contradição, o conflito, pode ser para sobreviver ou para o simples prazer, no caso dos homens. As relações humanas se estabelecem em torno de interesses conflitantes entre a necessidade e o livre arbítrio, o poder e a liberdade, etc. . Para haver dominantes, terão que existir dominados, cada categoria gera duas faces.
Chegamos então a valorização. Valorizar é atribuir sentido à existência, a vida. É através de uma escala valorativa que isto se faz, é priorisando determinadas categorias em prol de outras, elegendo determinada maneira de existir como a melhor. Toda vez que agimos em função de princípios valorativos, está buscando dar sentido ao caos humano. A utopia em sentido amplo é o caldo valorativo por excelência, não o bastante, porém, para explicar, justificar ou abarcar todo o complexo valorativo, o perigo reside não na utopia em si, mas em nome dela passarmos a julgar o fato de existir de maneira diferente, a intolerância. Este é o campo da moral, é o desvirtuamento da tentativa de atribuir sentido à vida, em nome do julgamento da própria existência, uma castração ao ato de viver em prol de uma escala valorativa imutável, a temporal e dogmática. Do outro lado existe o campo da ética, atribuindo mais importância ao ato de viver em si mesmo, como bem maior, respeitando as diferenças das utopias e seus relacionamentos, questionando sempre seus valores, suas escalas, a luz da pluralidade e da mutação que o tempo e o espaço exercem sobre a sociedade e o conhecimento humano, como toda categoria dialética. Assim a ética está para a ciência, como a moral para a mística.
O pensamento humano, sua imaginação são o espelho do caos. Somente quando o homem constrói uma cultura, uma produção, age com sentido, se contraponto ao anarquismo biológico. O mundo natural não é caótico, é probabilístico e regido por leis. Se comparado ao mundo cultural é sem sentido, porque sua organização não é realizada a partir de realidades culturais. Este conflito não pode ser analisado por um método lógico, sistemático, mas tem natureza dialética. O método dialético é ético, na medida que busca a totalidade, não só como necessidade científica, mas porque reflete a realidade humana como se apresenta.
Assim, para a teoria marxiana, a História nasce de suas próprias condições, da realidade. Não existe um sistema da história humana, ela é uma construção realizada através de atos. Tem natureza acumulatória, tem sentido e progressividade. São os sucessivos modos de produzir criados pelo homem, formas de organização social, cada qual buscando mais eficiência. Este fato, não é uma lei positivista abstrata, contudo, trata-se de uma constatação empírica de nosso passado. Quase todo método dialético é suscetível às condições históricas, modificando-se conforme sua base real se transforma. Os atos humanos individuais ou coletivos - entes, grupos ou classes sociais - podem não ter uma relação de causa e efeito, ou interagirem necessariamente. Não são sistematizáveis. O homem tem o poder da abstração, da consciência e por isso é um ser que se auto-engana, se idealiza, idealizando o mundo em sua volta.
O caos não é natural, não nasceu da probabilidade, da física, da biologia. O mundo natural jamais foi caótico, anárquico. Sempre obedeceu a leis, a princípios lógicos, sempre foi previsível, medível, quantificável e observável. O caos é um fato cultural humano, nós como seres biológicos conscientes e pensantes, inexplicáveis segundo as leis criadas por nós, para explicar o mundo natural que nos cerca. O aparecimento da fé, de nosso criador, justifica o aparecimento do caos, o verdadeiro, que é caracterizado pelo surgimento da espécie humana.
A gênese de um animal, que não é somente um ser biológico, é o único acontecimento caótico do Universo conhecido, e Deus é a prova de tal fato. Como um ser onipresente, dirigiu e criou o teatro universal, o qual, nossos cientistas cultuam como divindade. O caos humano vai muito além de nossa imaginação, de nossa capacidade cerebral, porque rompe com a relação causa e efeito natural, deixa tão tonta nossa ciência técnica, que vaga em busca da metáfora da caverna de Platão. Assim, um animal biológico virou Deus, um ser sem existir, um ser sem biologia, o corpo humano, foi relegado à morada descartável da cultura.
O homem expulsou a natureza, o mundo natural, a entropia do paraíso. Nunca mais o tempo será o mesmo, nunca mais às estruturas ecológicas serão as mesmas. O homem tornou obsoletos à mutação, à procriação biológica, à adaptação para sobrevivência. O demônio humano com sua cultura destruiu a paz universal, feriu de morte o fatalismo natural. Alguns acham que a natureza, sua entropia, maltratada e prostituída pelo uso de suas próprias leis, por seu filho pródigo, e agora cafetão, que a surra e engana a cada momento, vai um dia se vingar, pode ser, mas nunca ocorreu em seu próprio mundo, aonde a lei é dos mais fortes.
A roleta está viciada, a probabilidade morreu na mão do jogador trapaceiro com seu método caótico cultural, que se modifica, modificando a si próprio, como no jogo entre dois espelhos, a repetir ao infinito uma mesma imagem, ou infinitas imagens. Agora, estamos sós, com nossa criatura, a cultura humana, não pode ser entendida a partir de seu início, mudaram as regras do jogo, com o jogo em andamento, e elas continuam sendo mudadas. O trapaceiro enganou a si próprio com seu jogo. Quando encontra o caminho, pensa estar errado, porque continua pesando no paraíso, sua ordem, sua lógica. Precisamos começar a caminhar para frente, chega de círculos, é preciso coragem para destruir o método lógico empírico. Libertarmo-nos das amarras que nós próprios criamos. Porque nunca estivemos no paraíso.
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